PERSEGUIÇÃO NA IGREJA PRIMITIVA
Jesus nasceu num tempo em que o
mundo era dominado por Roma e os judeus embora submissos ao poder romano, nunca
se conformavam com tal governo. Havia em Israel diversas ideologias que
chamavam a atenção do povo à permanência na fé e no patriotismo: os saduceus,
fariseus, essênios e zelotes, que fomentavam nos judeus o desejo de libertação.
Enquanto isso os judeus espalhados por todo o mundo lutavam para se manter
fiéis em meio a diferentes culturas.
O Império Romano possuía o
controle político de Israel, mas não o cultural e religioso (embora fosse
inevitável alguma influência) e os judeus resistiam fortemente à helenização e
ao sincretismo que os cercava, provindos da forte e dominante cultura
greco-romana da época. Jesus viveu em meio a estas circunstâncias e os
cristãos, juntamente com os judeus, se esforçavam para não ser influenciados
pelos costumes pagãos.
Em Jerusalém estava a maior parte
dos cristãos, dirigida pelos apóstolos. Nessa cidade haviam vários judeus que
tinham influências helenistas e falavam o grego, sendo distinguidos dos outros
judeus anti-helenistas. Na Igreja haviam conversos de ambas as posições. Então
houve a necessidade de se nomear os diáconos (de origem helênica) que
trabalhavam junto com os apóstolos na área social e administrativa,
representando os judeus gregos na direção da igreja.
Como narra Ato dos Apóstolos, a
igreja crescia na comunhão, mas crescia também a perseguição contra ela e os
cristãos se dispersavam, mas isso fez que expandisse a fé. Os de origem judaica
pregaram, principalmente aos seus conterrâneos que encontravam pelo mundo e os
de cultura grega anunciavam a fé por toda a parte do mundo por onde iam.
Com a conversão de muitos gentios
e a conseqüente formação de igrejas em diversos lugares, os apóstolos começaram
a visitar estas comunidades e a ver o propósito de Deus em anunciar o evangelho
por toda parte. Então Felipe, Barnabé, Paulo, Tiago e muitos outros viajavam
com a missão da evangelização e organização de igrejas, sendo eles perseguidos
por onde iam. Assim a igreja chegou desde os grandes centros da época até os
“confins da terra”, por iniciativa apostólica ou como na maioria das vezes por
iniciativas isoladas de cristãos que pregavam por onde iam, movidos pelas
viagens de negócios, vocação missionária ou empurrados pela perseguição.
Os primeiros cristãos não achavam
que estavam criando uma nova religião e sim que vivenciavam o cumprimento das
profecias judaicas sobre o Messias. Mas com o tempo foi crescendo a diferença
entre os judeus que não criam em Cristo e os cristãos judeus. Estes foram a
cada dia mais deixando de ser judeus para serem cristãos. Esses problemas
geravam vários conflitos entre eles, mas tantos judeus como cristãos tinham
problemas com Roma, o que trouxe inúmeras perseguições aos dois grupos até se
concentrar nos cristãos, o grupo mais crescente, sendo que os judeus se
limitavam ao seu povo, já os cristãos conquistavam todos os povos.
O império via isso como um risco
e sob a ordem de vários imperadores, perseguiram e mataram os cristãos como se
fossem perigosos para a humanidade. Nero foi o primeiro e mais bravo dos
perseguidores e para explicar o seu prazer em martirizar, chegou a culpá-los do
catastrófico incêndio de Roma. Terminado o seu governo os seus sucessores
continuaram o seu massacre. Muitos destes martírios foram relatados nas atas
dos mártires, escritas principalmente no século segundo.
O imperador Trajano, ordenou que
os cristãos não fossem perseguidos, mas que se fossem acusados ante as
autoridades, deviam ser castigados pela rebeldia de não adorar o imperador e se
diante dos tribunais não negassem o Cristo deviam ser mortos. Mesmo diante do
fogo, feras e forcas, milhares de cristãos não cederam, deixando belíssimos
testemunhos como os de Inácio, Policarpo e de Justino. Embora houveram períodos
de larga perseguição, permaneceu até o fim do século segundo a política de
Trajano, de não perseguir diretamente a igreja. Porém os cristãos sabiam que
mesmo que gozassem de períodos de paz em alguns lugares, a qualquer momento
poderiam ser entregues.
Enquanto não eram perseguidos
pelo imperador ou entregues aos tribunais por acusadores movidos de inveja, os
crentes sofriam grande difamação em todo império. Os boatos tinham duas
origens: popular e culta. Entre o povo, que era privado de cultura, corriam
suspeitas de imoralidade, vícios e sacrifícios infantis, sendo iniciados ao
cristianismo somente os cúmplices destes crimes. Já os estudiosos da época,
refutaram as doutrinas cristãs, vendo os cristãos como rebeldes que se negavam
a servir o imperador e ignorantes por servirem um Deus invisível, ao mesmo tempo
Onipotente e interessado na vida humana. Por tudo isso tanto o povo quanto os
filósofos os chamavam de ateus.
Os cristãos abandonavam as
atividades sociais por terem elas ligação com o paganismo, não comiam comidas
sacrificadas a ídolos e não faziam parte do exército. Essa separação causava
aversão nas pessoas que os cercava. Mas de fato muita coisa da cultura da época
era incompatível com a fé em Cristo.
Para defender essas acusações, se
levantavam filósofos cristãos que argumentaram sabiamente cada uma delas.
Principalmente Justino o Mártir, que era conhecedor de cada uma das filosofias
de sua época e testemunhou ser o cristianismo o mais correto e defender a fé
cristã deixando corajosos discípulos como Taciano. O importante dessa
apologética foi mostrar as incoerências dos cultos aos deuses gregos e romanos,
que eram cheios de falhas e maus exemplos.
Enquanto os de fora maldiziam a
igreja, também os chamados cristãos haviam discussões doutrinárias. Alguns
conversos uniam à sua fé, muitos de seus pensamentos, cultura, ou falta de
cultura, trazendo alguns problemas de interpretação das escrituras.
Houve duas principais correntes
de pensamentos hereges que tentaram seduzir a igreja: o gnosticismo e os
ensinos de Márciom. Ambos negavam a criação, o nascimento virginal de Cristo, a
ressurreição e o juízo final. Davam explicações filosóficas (misturadas ao
cristianismo) para tudo.
Para se proteger de tamanhas
heresias, a igreja se beneficiou da formação de um cânon oficial do Novo
Testamento, formado basicamente dos evangelhos, os escritos de Paulo e dos
apóstolos. A este cânon foi unido o Antigo Testamento. Também, baseado na sã
doutrina foi definido o credo apostólico, como uma fiel afirmação de fé,
firmada no que os apóstolos de Jesus Cristo haviam recebido do Senhor e
transmitido à igreja, que não era formada de grupos separados e diferentes, mas
foi organizada como uma só igreja católica (universal) e que pregava a verdade
“segundo o todo”.
Como fruto de toda essa
preocupação teológica por parte da igreja, muitos mestres surgiram no segundo
século e dentre eles quatro tiveram grande importância: Irineu de Leão, um
pastor, preocupado em manter e ensinar a sã doutrina; Clemente de Alexandria,
um sábio pensador que usou a filosofia para confirmar a fé cristã; Tertuliano
de Cartago, um apologista defensor das Escrituras, mas que acabou por se juntar
a um grupo de montanistas considerados pela igreja como hereges; por último um
discípulo de Clemente, que foi Orígenes de Alexandria, um mestre e discipulador
de novos convertidos muito conceituado por seus conhecimentos e que uniu aos
seus ensinamentos, muitos ensinos de Platão, desviando-se da sã doutrina.
Durante esse tempo, a igreja
estava relativamente em paz, embora persistia o decreto de Trajano e
freqüentemente em alguns lugares, cristãos eram denunciados e torturados até a
morte. Porém no início do século terceiro o imperador Sétimo Severo se levantou
após alguns conflitos internos no império e quis fortalecer a este por meio da
unificação religiosa num sentido sincretista de adorar o sol. De todas as
religiões se destacavam os judeus e cristãos, que não se rendiam à mistura de
sua fé com o culto ao Sol. Então Sétimo Severo proibiu qualquer conversão ao
judaísmo e ao cristianismo, o que desencadeou uma enorme perseguição
principalmente aos novos cristãos, mas também, aos cristãos antigos que segundo
a velha lei eram delatados.
Os sucessores de Sétimo Severo
seguiram seu exemplo sincretista mas não de forma tão esmagadora. Isso deu um
alívio de quase meio século para a igreja, que cresceu tranqüilamente até que o
imperador Décio recomeçou uma nova perseguição.
Décio percebeu que o martírio não
intimidava o crescimento do cristianismo, então resolveu lutar para restaurar
as antigas religiões e deuses romanos e gregos que ele julgava pudessem
proteger o império. Considerou-se então os cristãos como culpados de todos os
males sucedidos, crendo que por sua causa foram abandonados e desprotegidos
pelos seus deuses. Então quem não adorasse aos deuses do império e ao próprio imperador
era acusado de falta de patriotismo e traição, já quem o fizesse recebia um
certificado que o protegia de retaliações.
A igreja que até então estava
tranqüila foi pega despercebida por esta prova e muitos sucumbiam ante a
perseguição, sendo os persistentes na fé chamados de “confessores”. Essa forte
perseguição não durou muito, assim como o reinado de Décio. Quando houve
tranqüilidade (que durou cerca de 40 anos) a igreja não sabia o que fazer com
os “caídos”, como definir até que ponto caíram e se podiam ser readmitidos na
comunidade.
Os confessores se achavam na
autoridade de readmitir e trabalhar com os que caíram. Esse assunto gerou
discussão entre os que eram radicais contra e a favor da readmissão. Cipriano,
bispo de Cartago, trabalho esta questão em conjunto com muitos outros bispos
que decidiram readmitir os cristãos que não haviam sacrificado, mas que
adquiram certificados, se mostrassem arrependimento. Os que sacrificaram seriam
readmitidos no leito de morte se arrependessem ou quando diante de uma outra
perseguição reafirmassem sua fé em Cristo. Já Novociano de Roma, insistiu que a
igreja devia ser pura e que receber aqueles que caíram maculava a igreja. Essa
questão dividiu a igreja várias vezes até que depois de muito tempo criaram um
sistema penitencial para aqueles que pecavam depois do batismo.
Os primeiros cristãos eram em sua
maioria, pessoas de classe baixa e pouco ou nenhum estudo, possuidores de uma
fé pura e sincera. Se reuniam geralmente nas casas principalmente aos domingos
para cultura a Jesus Cristo na memória da sua ressurreição e partilhar o pão.
A igreja era basicamente
organizada com bispos, presbíteros e diáconos podendo variar de acordo com a
localidade. Além disso haviam mulheres que profetizavam (pregavam) e eram
diaconisas, a comunidade cristã, a princípio não possuía estratégias
missionárias ou pessoas que tivessem esta função, porque todos cumpriam a
missão evangelística naturalmente. À medida em que crescia e se estabilizava a
igreja, os cristão foram deixando marcas de sua fé através de construções de templos,
memoriais e diversos objetos artísticos de valor significativo. Todas essas
coisas podiam ser feitas enquanto não eram perseguidos.
Por fim, quando o império romano
estava dividido em duas partes e sobre cada uma delas (a oriental e a
ocidental) havia um “augusto” e um “cézar”, desencadeou-se a pior e última
perseguição romana. Primeiro, Diocleciano, augusto do oriente, expulsou os
cristãos que ainda faziam parte do exército, pois grande parte era pacifista e
se negava a participar das cerimônias religiosas do exército. Depois, sob a
influência de Galério (cézar do oriente), Diocleciano ordenou que fossem
destruídos os templos e livros sagrados. Galério providenciou que os cristãos
que negassem entregar os prédios e livros, fossem torturados e mortos, além de
culpá-los de um incêndio no palácio imperial.
O ápice dessa percepção foi
quando Diocleciano prendeu todos os líderes e ordenou que todos os crentes
deveriam sacrificar aos ídolos sob a ameaça de torturas e mortes. Esse Galério
acabou por tomar de Diocleciano o lugar de “augusto” e como imperador massacrou
a cristandade até que em seu leito de morte libertou os cristãos em troca de
suas orações por ele.
Como o império não tivesse um
governo único, durante esse período houve muita disputa pelo poder envolvendo
muitos personagens importantes, mas Constantino conseguiu assumir todo o
império confiado no nome de Cristo. Fazendo logo em seguida um acordo de paz
com os cristãos, chamado de “Edito de Milão”. Daí pra frente os problemas da
igreja não foram mais com Roma, que depois de ser o centro da perseguição aos
cristãos, se tornou a capital do cristianismo.
FONTE GONZALEZ, Justo L.; A Era dos Mártires, 3ª ed. São Paulo, Edições Vida Nova 1986, 177 páginas.
merlhor lição que ja li isso sim que devemos ler para que ficamos mas intendito palavra
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